Damp: 50 anos de tradição, sorvetes e sabores no Ipiranga

Foi em 1970 que um grupo de amigos italianos se juntou a um brasileiro para fundar a Damp Sorvetes, um dos patrimônios do bairro Ipiranga. Sempre com movimento e até filas aos finais de semana, inclusive em dias mais frios, a casa reúne muitas histórias e uma infinidade de sabores do doce de fabricação própria.

Arnaldo, Masaniello e Pietro, vindos da Itália, se juntaram com Dalton, nascido no Brasil. Inicialmente, queriam abrir um restaurante de massas, como as da “nonna“. No final das contas, a massa virou de sorvete mesmo, já que Pietro, que era engenheiro, conhecia o processo de fabricação em seu país de origem.

Com as iniciais dos quatro se formou a Damp. A fábrica iniciou os trabalhos num pequeno imóvel no Ipiranga, que depois se expandiu e permanece no mesmo local até hoje. “Era um porãozinho, onde eles ficavam elaborando sorvetes“, contou ao Ipiranga Feelings a Dalmira, dona da sorveteria e viúva de Masaniello.

A ideia era propagar em São Paulo o verdadeiro gelato artigianale, o sorvete artesanal que os italianos fazem tão bem. Inicialmente se atentavam a desenvolver apenas os sabores mais básicos. O de creme e o de flocos, com a mesma receita até hoje, foram uma criação de Masaniello.

Criar sorvetes era uma obsessão para o masaniello

– declarou Dalmira ao Ipiranga Feelings
Foto: divulgação/DAMP
Foto: divulgação/DAMP

Pietro e Arnaldo receberam oportunidades de trabalho na Itália. E Dalton, irmão de Dalmira, faleceu. A partir de então o casal passou a administrar a Damp. Depois de serem fornecedores para a rede de hipermercado Eldorado (ou Eldoro), de 1980 a 1991, abriram a sorveteria na R. General Lecor, 512, onde permaneceram até cinco anos atrás.

Em 2015, o negócio virou a esquina para se instalar em uma loja bem maior, com atmosfera retrô, mais assentos e mesas para acomodar a fiel clientela. Dalmira, porém, recusa a ideia de sofisticação. “Não queríamos que aqui parecesse um lugar caro, que afastasse as pessoas. Pensamos em um ambiente bonito, acolhedor e familiar”.

Familiar é uma palavra que representa a sorveteria. São várias gerações frequentando o mesmo local. Até ensaio fotográfico de casamento já aconteceu ali, feito por um casal que se conheceu na Damp.

Com o tempo, a empresa se tornou referência em sorvetes bem feitos e ganhou relevância na mídia especializada. Nas criações desenvolvidas ao longo dos anos há mais de 100 sabores em sorvetes de massa, picolés, bolos de sorvete, cassatas, tartufos e sobremesas geladas individuais.

A Damp é uma das únicas em SP que ainda faz Cassatas, sobremesa de sorvete em barra com cobertura servido em festas, como se fosse um bolo – Foto: divulgação/DAMP

O destaque, porém, são os sabores variados, criativos e um tanto exóticos, que provavelmente não serão encontrados em outras sorveterias da cidade. Água de rosas, violeta, gorgonzola com nozes, queijo brie com damasco e manjericão com amora são alguns dos exemplos.

Sementes e frutas do Norte, Nordeste e Cerrado já apareceram nas receitas. E até a grumixama, uma frutinha nativa da Mata Atlântica, semelhante à cereja negra, esteve na vitrine colorida do self-service de massas da Damp, que vai fazendo um rodízio de aproximadamente 50 sabores para dispor aos clientes.

“A gente vai testando os sabores. Tem coisa que não dá certo, também erramos muito. Mas estamos sempre nos atualizando”, contou Dalmira.

Foto: divulgação/DAMP

Entre os favoritos do Ipiranga Feelings estão os de flores, de capim santo, doce de leite, pistache, Marquesa de Santos (tapioca com vinho do porto) e chocolate amargo. Com tanta diversidade, fica fácil se empolgar, mas lembre-se que o potinho é cobrado por quilo! Dá para optar pela quantidade de bolas na casquinha também.

Além dos sorvetes, também gostamos bastante de tomar o café espresso numa casquinha em formato de xícara. A bebida vem acompanhada de uma pequena quantidade de sorvete à escolha (sugerimos o Baby Milk, fica uma delícia) para adicionar no café quente. Pode ficar tranquilo que a casquinha não desmonta!

O processo artesanal

Na fábrica, que fica na Rua do Manifesto desde as origens da Damp, ainda seguem um processo artesanal de produção e um rigoroso controle de qualidade. Parte da matéria-prima é importada da Itália, França e Índia.

Há pessoas que acham caro porque falam que o ingrediente é barato. Mas o processo de fazer o sorvete não é fácil, é complexo. A gente tem uma pessoa para retirar a casca das castanhas e do gengibre, por exemplo”, justifica Dalmira. “Fazer o sorvete de tapioca é super difícil também. Os grãos precisam ser selecionados, porque pode vir alguma sujeira ou grão irregular”.

Ela também explica que o sorvete da Damp não é feito com base em aditivos químicos. “Não existe uma base usada para todos os produtos, que a gente vai adicionando o saborIsso não é sorvete artesanal. Aqui cada um deles tem uma receita própria. O nosso diferencial é esse, trabalhar com qualidade e de forma muito artesanal”, explicou.

Foto: divulgação/DAMP

Para se manterem atualizados com as tendências europeias, Daron Soares, também da família, é quem cuida das receitas atualmente. Ele viaja frequentemente para a Itália em busca de inovação e inspiração.

Ao longo dos anos, a equipe vem trabalhando em diminuir o açúcar nas receitas, para garantir um produto mais puro. E Dalmira também se posiciona em relação à escolha. “O paladar do brasileiro é muito doce. As pessoas precisam ver o sorvete como um alimento, a base de leite e creme de leite. Não precisa ser só uma sobremesa”.

Apesar de colher bons frutos com o negócio, Dalmira não titubeia ao comentar os tombos de sua jornada. Não sente vergonha dos erros e das crises, mas sim orgulho, porque tudo isso faz parte do negócio e abriu portas para o sucesso que mantém hoje.

O pior período era o inverno, que não atraía as pessoas para a sorveteria. Era um dilema não apenas para a Damp e outras sorveterias. Dalmira relembra um episódio que a marcou:

“Tivemos muitas crises sim…muitas! Nunca me esqueço de um dia que abrimos, naquele frio, e vendemos UM picolé. Imagina, ficar com a loja aberta o dia todo pra vender um picolé. 

Atualmente o clima não é mais uma preocupação. Passadas as crises, vem a reinvenção. “No inverno temos outros produtos para nos manter e seguimos em frente. Os sabores são sazonais também. Quando está mais frio, a gente aumenta a produção de chocolate, por exemplo”.

Em períodos festivos, a Damp ganha não apenas decoração temática, mas sabores que condizem com as datas. Celebrando a Festa Junina, tem sorvete de quentão, de pudim e de milho verde entre as opções.

Embora a produção e a matriz sigam firmes no Ipiranga, a Damp também expandiu as unidades, que funcionam como franquias. Há lojas nos bairros Alphaville, Perdizes, Tatuapé e Aclimação.

“D” de dalmira

Dalmira já está na casa dos 90 anos de idade, mas segue na ativa. É reservada e ao mesmo tagarela, e um tanto espevitada. Resiste a dar entrevistas, pois não quer se expor, o que é compreensível. Mas nos recebeu com toda a sua simpatia, mesmo achando que não tinha “muito o que contar” sobre suas nove décadas de vida.

Mais tarde descobriríamos uma fascinante figura, batendo papo conosco na mesa da Damp. A empresária é fisicamente miúda, mas dentro dela se sobressai uma mulher gigante. Na foto abaixo aparece à esquerda, ao lado da Elisângela, nutricionista que está na equipe há mais de 20 anos, e a apresentadora Maria Cândida ao centro, que gravou matéria na sorveteria.

Foto: divulgação/DAMP

Dalmira nasceu na cidade de Cabrália e depois foi para Presidente Venceslau, interior paulista. Ao chegar em São Paulo, virou professora de Literatura. A rotina dedicada à atividades escolares mudou quando ela ouviu uma simples e descompromissada frase:

“Vamos tomar um sorvetinho?”

Pois é, até mesmo o início da história de amor entre Dalmira e Masaniello começou em sorvete. Quando questionada sobre como eles se conheceram, ela falou de forma meio debochada: “ah, na rua…” e todos na mesa caíram na risada. “Estava andando com uma amiga, ali no Centro da cidade, e ela encontrou um rapaz que conhecia. Ele estava com o Masaniello”.

Na época, Masaniello não tinha nada de sorveteiro. Trabalhava como desenhista em um escritório de arquitetura. “Mas eu tinha viagem marcada para a Europa. Fui e ele ficou. Me deu o telefone do escritório dele. Naquele tempo não tinha celular nem como contatar a pessoa facilmente. Tinha que marcar um ponto de encontro e ir”, recorda Dalmira.

Aí um dia ele falou ‘vamos tomar um sorvetinho?’ Naquela época a gente não bebia, não saía para beber. Então fomos em uma sorveteria na Av. Ipiranga“.

A única foto de Masaniello e Dalmira juntos foi tirada pelo blog Curiocidade em 2012

Ela não resistiu à pergunta, afinal, gostava de sorvete desde a infância. O passeio virou casamento e a cerimônia aconteceu na Paróquia Nossa Senhora da Assunção, igreja bem conhecida na Av. Nazaré. Ficaram juntos até Masaniello falecer, em 2015. O amor permanece, inclusive por sorvetes.

“Quem diria que eu, professora, ia virar sorveteira…Engraçado pensar nisso, parece que foi o destino.”

Foto: divulgação/DAMP – cedida gentilmente ao IpirangaFeelings

Vai lá!

Damp Sorvetes
R. Lino Coutinho, 983 – Ipiranga/SP

Terça à Domingo 11:00-19:00h
Não tem estacionamento
Aceita cartões.

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Redação

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